Conversa com
o médico e mestrando
Bruno Cota
sobre sua pesquisa
na qual ele estuda
as habilidade musicais
e dificuldades
de aprendizado
em pessoas com NF1 e NF2.
1) Bruno, você é médico e músico. Como você se
interessou pelas neurofibromatoses?
Em 2013, conheci a
professora Ana Lana e a neurocientista Marília Nunes, em um curso na UFMG
sobre Neurociência e música, e desde então direcionei meus esforços para
também tornar-me neurocientista da música, sempre com o apoio e incentivo de
ambas. Através delas conheci a professora Luciana Macedo, que mais tarde
tornou-se importante viabilizadora desse sonho, como orientadora do meu projeto
de mestrado, que a princípio consistiria em avaliar os efeitos analgésicos da
música.
Convidamos para a
co-orientação daquele projeto o professor João Gabriel, de quem fui aluno na
graduação em medicina e por quem sempre tive grande apreço. O mesmo aceitou o
convite com entusiasmo, mas diante das dificuldades técnicas para o
desenvolvimento do projeto anterior, sugeriu pensarmos em algo diferente.
João
Gabriel disse-me então que, num encontro casual, você havia comentado com ele
sobre a suspeita de um possível comprometimento do processamento musical em
pessoas com Neurofibromatose do tipo 1, doença que até então eu só conhecia
pelos livros.
Após uma semana de
estudo intensivo sobre os assuntos envolvidos, vi que essa suspeita tinha
fundamentos que justificariam essa investigação, até então não documentada na
literatura. Ao ser recebido de braços abertos por você, pelo diretor do CRNF Nilton
Rezende e pela fonoaudióloga Pollyanna Batista, não hesitei em mudar meus
planos e definitivamente colocar em prática o novo projeto sobre dificuldades
musicais em pessoas com NF1.
E, seja por essas
circunstâncias ou por razões que ainda desconheço, apesar do pouco tempo de
convivência e atividades no ambulatório, suspeito que as Neurofibromatoses não
mais significam para mim somente algumas páginas de um livro na estante: tornaram-se
um novo capítulo na minha história de vida, a ser construído com toda a
dedicação que cada grande oportunidade merece.
Portanto,
interessei-me pelas neurofibromatoses graças à persistência e à sorte, em uma
cadeia de eventos, nos quais se incluem ganhos e perdas, realizações e
frustrações, mas acima de tudo, pessoas fundamentais.
2) Então qual é a pesquisa que está realizando no
CRNF?
A pesquisa tem como título “Amusia como distúrbio auditivo central na
Neurofibromatose tipo 1”. A amusia, que consiste na incapacidade parcial
ou total de perceber e reproduzir música, será investigada no meu
estudo por meio de um teste que avalia algumas habilidades musicais dos participantes. Além
desse teste, será realizada uma avaliação básica da audição, através dos exames
audiometria e imitanciometria, e um exame eletrofisiológico da audição, que
avalia como o som se processa no cérebro.
Todos os testes são confortáveis e não-invasivos, ou seja, não envolvem
instrumentos que rompem a pele ou que penetram fisicamente no corpo. Também não
emitem radiação, nem colocam em risco a integridade física ou psíquica dos
participantes.
O tempo total dos testes é de aproximadamente 2 horas, sendo que os
participantes que já se submeteram à avaliação audiológica básica recentemente
não precisam repeti-la, reduzindo esse tempo de avaliação para 1 hora e meia,
aproximadamente.
3) O que é que espera encontrar na pesquisa,
ou seja, qual é sua hipótese?
Nossa hipótese é que a ocorrência de amusia seja maior entre os
indivíduos com NF1 do que naqueles que não têm a doença, inclusive não esperamos
encontrar a amusia nas pessoas que têm NF2 e audição preservada.
Acredita-se que a amusia seja decorrente de um transtorno do
processamento auditivo central. Isso significa que a forma como o cérebro
interpreta a música está alterada nos indivíduos chamados “amúsicos”, apesar de
não terem nenhum problema nos ouvidos ou em outras estruturas envolvidas na
audição.
Em indivíduos com amusia desde o nascimento, foram observadas importantes
alterações localizadas na substância branca cerebral, através de pesquisas com métodos de
imagem (ressonâncias magnéticas). Sabe-se também que nas
pessoas com NF1 são comuns as alterações na substância branca e há estudos que correlacionam esses
achados com algumas desordens de linguagem e de aprendizado, também frequentes na NF1.
Além disso, em recente estudo desenvolvido pela Pollyanna no CRNF,
constatou-se, de modo inédito, a existência de importante prejuízo do
processamento auditivo em portadores de NF1, os quais também podem estar
relacionados às alterações descritas.
Portanto, este conjunto de informações científicas constitui a fundamentação teórica que
justifica a nossa investigação da amusia na NF1, reforçada pela opinião clínica
de experientes profissionais que lidam com as neurofibromatoses.
4) Você já tem resultados preliminares?
Na maioria das
avaliações realizadas até o momento constatamos algumas alterações importantes
no processamento musical nos portadores de NF1, quando comparados aos outros
indivíduos sem a doença. Mas ainda estamos na fase inicial. É preciso um número
maior de avaliações para concluirmos com segurança, baseada em uma criteriosa
análise estatística.
Portanto,
precisamos muito da ajuda de todos que tenham disponibilidade em participar da
pesquisa, sejam pessoas com NF1 ou não. Cada participação é valiosa, pois esperamos
que nossos resultados tragam novos conhecimentos em relação à
doença. Quem sabe, com esse estudo poderemos trazer mais esperança
de tratamentos para as pessoas com NF1?
Quem tiver
interesse em participar e nos ajudar é só entrar em contato pelo e-mail brucezar@hotmail.com.br ou telefones: 31-8806-3535 (Oi) ou 31-9194-2235 (Claro).
As avaliações são
realizadas na Faculdade de Medicina da UFMG, que fica bem próximo ao
ambulatório do Centro de Referência em Neurofibromatoses. Agradeço desde já a todos que puderem participar desse projeto!
Marcadores: amusia, Bruno Cota, desordem do processamento auditivo, dificuldades de aprendizado, neurofibromatose do tipo 1, neurofibromatose do tipo 2