Pergunta 246 – Benefício financeiro resolve as dificuldades na NF1?

“... às vezes e tão difícil de conseguir enfrentar tudo sozinha, tenho família, meu esposo mas... parece que fingimos não ter nada, ninguém diz nada e eu, para não preocupar meu esposo que precisa trabalhar, me calo... e os outros cada um ocupado com a correria do dia a dia... Minha filha está com 25 anos e é o motivo da minha grande preocupação, não sei mais o que fazer: olho para ela, cada dia mais crescendo estes carocinhos e seu corpo, está muito visível cada dia mais no rosto, meu coração chega doer vendo as outras jovens de sua idade se preocupando com a pele, celulite, coisas que ficam tão pequenas diante das dificuldades da minha filha... Vejo que ela está sendo cada dia mais prejudicada na vida, parece que ela é invisível aos olhos da humanidade, ela nunca trabalhou devido à dificuldade escolar para escrever, ela troca muitas letras e lê muito mal, amigos quase não tem devido não conseguir ser igual às outras, vive tentando arrumar amigos, mas hoje é tudo moderno e ela muito quietinha logo se afastam... Tinha um namorado desde 16 anos, mas agora, antes de se casar ele foi embora e diz que ela não trabalha para ajudar, diz que ela não faz nada, meu Deus, o que posso fazer para ajudar minha filha, para vê-la feliz... Sei que tem pessoas muito pior que a gente peço perdão a Deus, mas gostaria muito que não fosse assim... Hoje as pessoas dão muita importância para aparência e me preocupo muito. O senhor acha que eu posso conseguir um benefício para ela? ” NJ, de local não identificado.


Cara N, obrigado pela confiança em nós para expor seu coração.

Hoje inverto nossas posições e sou eu quem farei a pergunta: se sua filha vier a receber um benefício financeiro, resolveria os diversos problemas que nos apresentou em seu sofrido depoimento?

Primeiro, vamos ver o auxílio financeiro. É possível? Sim, dependendo do estado geográfico (Minas Gerais e Espírito Santo têm legislações facilitadoras) e do estado de saúde de sua filha (o que tem que ser determinado por exame realizado pela perícia do INSS).

Não duvido que vocês possam precisar de um auxílio financeiro, mas fiquei com a impressão que esta questão seria a ponta do Iceberg da neurofibromatose de sua filha, ou seja, seria a parte menor daqueles enormes pedaços de gelo que flutuam nos mares gelados, dos quais vemos apenas a ponta que fica acima da superfície.

Você nos relatou que sua filha tem grande dificuldade de relacionamento social, poucos amigos e um namorado que a abandonou depois de vários anos. Que ela tem dificuldades de aprendizado que possivelmente a impedem de conseguir um trabalho adequado.

Você percebe que os neurofibromas estão se tornando cada vez mais visíveis e assustada você antecipa o preconceito que teme acontecer “porque as pessoas dão muito valor à aparência”, provavelmente tanto quanto você, que a desejaria “linda” como as demais garotas.

Parece-me que você chega a desejar que ela não tivesse nascido (“gostaria muito que não fosse assim”) e pede perdão a Deus por causa deste sentimento que julga horrível, mas que todos os pais de pessoas com problemas genéticos graves chegam a sentir em algum momento de suas vidas.

Mas o mais importante é que tive a impressão que você tem muita pena de sua filha.

Às vezes confundimos sentir pena com sentir amor. Sentir pena é considerar o outro incapaz de se realizar como pessoa, mas incapaz segundo os nossos padrões, segundo os nossos critérios de felicidade e de sucesso, ou seja, incapaz aos nossos olhos.

O amor, ao contrário, aceita e respeita o outro com suas potencialidades e limitações, do jeito que ele é e reconhece que o outro pode ser feliz, mesmo vivendo de forma diferente do que imaginamos ser uma vida com felicidade.

No seu relato, você revela o desejo de que sua filha seja feliz e aí talvez esteja uma saída. O que seria a felicidade para ela? O que a faria feliz hoje? Pergunte à ela.

Talvez você se surpreenda com o fato de que ela se considera mais feliz do que você imaginava.

Talvez a maior felicidade sonhada por ela seja que sua mãe a aceite do jeito que ela é, com suas limitações, e a ajude a viver com elas, porque a neurofibromatose é permanente, mas é apenas uma parte do que sua filha é. Uma pessoa.

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